sábado, 29 de agosto de 2009

Afinal quem é brega no Brasil?

Tenho ouvido muitas coisas a respeito do compositor mais “papo reto” do Brasil: Belchior. Coisas positivas e coisas negativas. Até acho interessante a nova mania nacional de elaborar hipóteses para o sumiço de Belchior, embora eu acredite realmente que o Nietzsche brasileiro se cansou de toda essa mediocridade contemporânea e foi dar um rolé, “andar caminho errado pela simples alegria de ser”. Mas o que realmente me incomoda é quando alguém cai no lugar comum de dizer que Belchior é brega. Aí mexeu comigo!

Como podem reduzir a brega um cara que canta: “eu quero é que esse canto torto, feito faca corte a carne de vocês”? Qual foi a parte que eles não entenderam? Belchior é brega? O cara que compôs “Alucinação”, “Velha Roupa Colorida”, “Coração Selvagem”, “Comentário a respeito de John”, “Fotografia 3 x 4”, “Divina Comédia Humana”, “Mucuripe”, “Galos, Noites e Quintais”, “Como Nossos Pais”, e tantas outras canções fantásticas? Não, não! Brega é Fresno! (como diria meu amigo Orlando) Brega é a MTV querendo nos empurrar essas bandinhas e artistas sem conteúdo, brasileiros ou gringos, goela abaixo. Tentando transformar adolescentes brasileiros em paulistas e adolescentes paulistas em estadunidenses.
Para estimular a reflexão a respeito dessa discussão sobre o que é ou não brega, destaquei algumas coisas que eu considero verdadeiramente bregas, no pior sentido da palavra:

Querer adotar um modo de vida norte-americano em plena América do Sul; vestir crianças como personagens de “Malhação”; chamar ex- BBB de artista; querer ser playboy no terceiro mundo; ser racista em um país miscigenado; patricinhas tijucanas; esticar o cabelo para ir à praia; chamar fofoca sensacionalista de liberdade de expressão; dizer que vai a Nova York “se reciclar”; maconheiro de classe média que tem medinho de entrar na favela porque acha “mó bad trip”; pseudo-intelectuais; “cult bacaninhas” preconceituosos que chamam de brega tudo o que é popular; estudantes de engenharia dançando Funk em chopada; advogados que exigem serem chamados de doutor; chamar de doutor qualquer um que tenha dinheiro ou diploma; frequentar lugares de “gente bonita”; morar em Jacarepaguá e dizer que mora na Barra; a própria Barra da Tijuca, prima pobre de Miami, por si só é uma ode ao pensamento provinciano brasileiro; chamar nordestino de paraíba; neo-nazismo no século XXI; capa da Revista Sexy se auto intitular modelo e atriz; ir para o BBB pleitear contrato com a Playboy; falar em inglês coisas que podem perfeitamente ser ditas em português; chamar mulher de “cavala” ou “mulezinha”; emo de cabelo crespo que se mata a alisar o cabelo pra ficar com cara de inglês, mas só consegue ficar com cara de emo de cabelo crespo que se mata a alisar o cabelo pra ficar com cara de inglês; falta de consciência ecológica; silicone no peito do tamanho de uma bunda; balé de programa de auditório; mulheres fruta; madrinhas de bateria que só querem se promover e muitas vezes nem sabem sambar; mandar recados malcriados para pessoas que visitam seu Orkut; escrever frases clichês de liçãozinha de vida no MSN; chamar negro de moreno; mandar mendigo ir trabalhar; ser meritocrata no mundo subdesenvolvido; acompanhar vida de “celebridades”, falar gritando com as pessoas; etc, etc.

Enfim... eu poderia ficar aqui a vida toda que a lista não chegaria ao fim. Mas o que eu quero mesmo dizer é que não existe nada mais brega do que não se assumir do jeito que é, do que ficar querendo se distanciar de suas origens, do que ter complexo de inferioridade mal resolvido achando que há sempre um lugar que tem mais valor que o seu, do que ter medo de parecer brega, medo de mostrar suas vísceras.
Belchior sabe exatamente como fazer a veia do pescoço pulsar e, tudo o que foge disso para mim é de mau gosto.
Se ser brega é dançar forró na Feira de São Cristóvão ao invés de curtir uma “night” cheia de “gente bonita”, eu desejo vida longa ao brega e declaro: eu sou brega! E digo mais, nós somos muito mais geniais e talentosos quando não estamos tentando parecer geniais e talentosos, pois a sinceridade é a verdadeira elegância da vida. Como diria o grande mestre Belchior, “eu não estou interessado em nenhuma teoria, em nenhuma fantasia, nem no algo mais. (...)amar e mudar as coisas me interessa mais.”

4 comentários:

  1. Concordo com tudo, aí você vê né:
    que autoridade essa gente tem para chamar o Belchior de brega?
    Gentezinha careta né.
    Todos "cults" + "hypes" +"in" = deploráveis.

    Onde estiver, como estiver.
    Viva Belchior!
    E piedade aos caretas, piedade rss

    obs.: Valeu a citação rss

    Beijo!

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  2. Brega é vc querer ser o que os outros são,é perder sua individualidade em função de um coletivo massacrante pra se sentir parte de alguma coisa,ou seja,é querer ser o que não somos de verdade.Mais uma vez um belo texto,só sei de uma coisa minha querida mary.Não sou brega,não sou chique,não sou moderno e nem retrô,mas acho que sou uma mistura disso tudo.Falta de personalidade minha?Um papo pra uma outra postagem,beijos.

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  3. A simplicidade e sinceridade emocionante, fácil de ser entendida, de ser engolida, em teu texto, me alegraram.

    A discussão do que é ser brega, oulegal, é muito difícil de ser tocada, mas abordou com estilo interessante.

    O imporrante nisso tudo é preservar a liberdade individual de escolhas de cada um, e respeitar o direito de meus alunos em pintar a unha de preto e acharem que são londrinos, mesmo que morem em madureira!

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  4. Pois é Mary, está cada vez mais difícil ser apenas um rapaz latino americano sem dinheiro no banco e sem parentes importantes e, ainda mais, vindo do interior.
    bjo

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